Epicuro: Não gosta dos filósofos, então?
Hesíodo: Seu eu gosto?! Eu odeio! Tudo sanguessuga! Lixo!
Vivem largados na Ágora, pregando, empatando a vida e mendigando atrás de gente
decente que nem eu! É uma desgraça! A cada dez passos cê tropeça num vagabundo
tentando adivinhar a altura do sol!
William Messner-Loebs
Quando ouvi falar pela primeira vez em Epicuro, o Sábio,
fiquei receoso. Não porque o tema central da HQ fosse uma aventura hilária e
nonsense pela Grécia Antiga ou porque os quatro álbuns que formam o encadernado
trouxesse situações nas quais encontramos Platão, Sócrates, Aristóteles,
Homero, Esopo, Zeus e Alexandre, o Grande (que nessa história não é tão grande
assim, alias, é um pingo de gente enfezado com tudo, que espeta seus
professores, gosta de aventuras perigosas, caça, sangue, sexo, vinho e todos os
itens dignos de um príncipe macedônio), mas porque imaginava que teria uma aula
(chata) de filosofia via quadrinhos.
O texto de William Messner-Loebs
permite-se a licença poética e histórica para relacionar personalidades
terrenas e divinas que nunca estiveram juntas, mas que bem poderiam ter estado.
Em cada um dos alguns do livro, temos uma história peculiar, todas envolvendo o
nosso herói criador do hedonismo, o filosofo Epicuro de Samos, e claro, o
pequeno Alexandre, o Grande. Epicuro é amigo de Platão. Platão é desacreditado
por todo mundo, inclusive por Sócrates, que nunca ouve direito o que ele tem
para dizer. É simplesmente genial o modo como o filosofo é apresentado, já no
primeiro livro, Visitando o Hades, como um discípulo embasbacado, praticamente
uma criança nerd tentado ser ouvida pelo professor que não aguenta mais sua
participação e teorias nas discussões da Ágora, como falar de “sombras nas
cavernas” ou numa certa sociedade perfeita que poderia ser chamada de
“República”.
O que mais impressiona no texto de Messner-Loebs é a
naturalidade com que ele trata assuntos dramáticos e históricos, e ao mesmo
tempo, traz conceitos filosóficos simplificados sem nunca adquirir aquele tom
professoral, como se estivesse ensinando preciosidades únicas ao pobre leitor
ignorante. A filosofia e os eventos mais conhecidos como a Guerra de Tróia, por
exemplo (o meu único “senão” em relação ao livro), são contextualizados perfeitamente
na história do álbum, sem nunca fugir da proposta dramática inicial. Vemos
discussões e construções muitíssimo engraçadas entre esses neutoricos e egoicos
mestres do pensar. Há uma interação orgânica entre a ficção e a filosofia, de
modo que um serve de apoio ao outro.
Cada um dos quatro capítulos conta uma historia diferente, e
neles percebemos o envelhecimento das personagens e a mudança no estilo dos
desenhos de Sam Kieth. Visitando o Hades, Os Muitos Amores de Zeus, Domando o
Sol e Os Filhos de Helena são historias que obedecem um certo tempo cronológico,
mas se distinguem em continuação. Em cada uma delas, o autor elegeu um evento
real ou imaginário da historia da Grécia e procurou inserir neles as suas
personagens. O resultado é um mar de criatividade e bom humor, representados
por uma arte magnífica, obedecendo as exigências de cada situação, seja na
coloração dos quadros, das personagens, nos traços mais sujos ou limpos, na
diagramação mais simples ou mais imaginativa, e assim por diante.
O sonho de Epicuto era abrir uma escola de filosofia, mas
isso acabou lhe custando muito trabalho, suor e aventuras inimagináveis.
Epicuro, o Sábio é um livro que com certeza agradará a muitos. Além do texto
espirituoso e inteligente de William Messner-Loebs, a arte de Sam Kieth é um
presente de xenos (não-grego) para o leitor. Para quem imaginou que a filosofia
clássica não poderia ganhar uma boa versão nas paginas dos quadrinhos,
enganou-se. Eis aqui um incrível relato das aventuras de um grupo de pensadores
na badalada Atenas dos filósofos e dos seres divinos.
Texto de Luiz Santiago do Plano Critico.
Epicuro, o Sábio CDZ - precisa do programa CDisplay para a leitura
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